O
fundo financeiro criado pela Stratfor e o Goldman Sachs viu no memorando da
troika a hora certa para comprar obrigações da Parpública. A holding detém
participações do Estado nas empresas a privatizar sob orientação de António
Borges, que já fora o escolhido pela Goldman Sachs para prestar serviços de
consultoria à Parpública em 2004, no âmbito da privatização da GALP e
EDP.
ARTIGO
| 30 AGOSTO, 2012 - 02:21
António
Borges num Congresso do PSD em 2004, quando ainda trabalhava para o Goldman
Sachs, cobrando 2,3 milhões de dólares à Parpública por consultoria financeira
nas privatizações. Com a troika, agora é Borges que privatiza empresas detidas
pela Parpública e o fundo Goldman Sachs/Stratfor sai sempre a
ganhar.
Em
Fevereiro, a Wikileaksrevelou ao mundo o convite que o
Goldman Sachs dirigiu à empresa de espionagem Stratfor: a parceria num Hedge
Fund chamado Stratcap. De acordo com um email de Agosto de 2011, escrito por
George Friedman, o CEO desta “CIA privada”, a oferta partiu do director do
Goldman Sachs, Shea Morenz – “ele propôs uma nova aventura, Stratcap, que nos
permitirá utilizar o conhecimento que produzimos sobre o mundo num espaço novo
mas com conexões – um fundo de investimento. Onde previamente aconselhamos
outros Hedge Funds, teremos agora o nosso próprio, inteiramente fundado pelo
Shea (…) nos já estamos a trabalhar em simulações de investimento e
transacções”. Outros emails mostram que, durante 2011, foi montada uma complexa
estrutura financeira com recurso a offshores de forma a lançar
a Stratcap sob uma capa de aparente legalidade.
O
esquerda.net teve
acesso a estes emails revelados pela Wikileaks que indicam que a Parpública –
empresa que gere as participações do Estado português em grupos como a GALP,
REN, Águas de Portugal, TAP e ANA – estava na mira deste fundo de investimento.
Num email de Setembro de 2011 um alto
responsável da Stratfor, Alfredo Viegas, chama a atenção para o plano de
privatizações anunciado pelo Governo português e pela troika – “(…) isto abre
algumas oportunidades de negócio muito interessantes no que toca a empresas
paraestatais portuguesas e possivelmente em outros PIIGS (…) Para mim o activo
mais interessante são os 5,25% de obrigações da Parpública. O que torna estes
títulos muito interessantes é que são convertíveis para a GALP – aquela empresa
de combustíveis (…).”
A
Stratfor não perdeu tempo. Num documento enviado ao CEO, George
Friedman, intitulado “STRATCAP Portfolio - summary” é possível verificar a
inclusão de um quadro que faz referência aos títulos da Parpública. E já em 10
de Novembro, Alfredo Viegas exulta com as declarações de Pedro Passos
Coelho, que nesse dia anunciou o plano de cortar a despesa pública em
43% até 2014 – “(…) é muito agressivo. Se eles fizerem isso, Portugal é uma
grande compra… encurtando o nosso caminho para os títulos da
Parpública.”
António
Borges e a privatização da Parpública
A
Parpública foi criada em 2000 pelo Governo de António Guterres com o objectivo
de ser o instrumento do Estado para assegurar a gestão de empresas em processo
de privatização. Esta posição concedeu uma importância central a esta holding
pública que viu os seus lucros subirem a pique na última década, fruto das
privatizações levadas a cabo por todos os Governos. Com a vinda da troika e o
plano do PSD e CDS para privatizar as últimas jóias da coroa – TAP, ANA, CP
Carga, CTT e Caixa Seguros, Água de Portugal e RTP – a própria Parpública tem os
seus dias contados, pois o Estado deixará de ter participações nessas empresas.
Na segunda versão do memorando de entendimento foi avançada a possibilidade de
dissolução da Parpública ou a sua integração na administração pública, “uma vez
que as suas fontes de receitas serão afectadas pela privatização”.
A
verdade é que até à decisão final é pela Parpública que passará o processo de
privatizações, e é no âmbito da Parpública que opera António Borges, assessor
indicado por Passos Coelho para liderar o processo. Mas esta não foi a primeira
vez que António Borges lidou com a Parpública. Entre Fevereiro de 2004 e Abril
de 2005 o Goldman Sachs prestou consultadoria financeira à Parpública no âmbito
dos processos de privatização da GALP e EDP, recebendo por esse tempo 2,3
milhões de dólares do Estado português. Nesse tempo, o representante do Goldman
Sachs perante o Estado foi António Borges, que agora fala em nome do Estado a
defender as privatizações, incluindo o modelo ruinoso de concessão da RTP
apresentado na entrevista à TVI na semana passada.
A
ligação de Borges ao Goldman Sachs tem levado ao questionamento da sua
imparcialidade na condução do processo de privatizações. Marc Roche, autor do
livro «O Banco: Como Goldman Sachs dirige o Mundo», quando questionado sobre a
escolha de Borges pelo Governo de Passos Coelho, alertou – “O problema é que o
senhor Borges não disse o que fez no Goldman Sachs.Pode haver um conflito de interesses. É
preciso total transparência (…) O senhor Borges tem de decidir se o Goldman
Sachs tem ou não um papel nas privatizações».
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